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terça-feira, 31 de julho de 2018

ADÃO E EVA - EXPLICAÇÃO ESPÍRITA


O Espiritismo sendo o consolador prometido por Jesus, e vindo explicar o que Jesus não pode explicar em seu tempo, segundo o próprio Mestre; explica a passagem bíblica de Adão e Eva, no livro A Gênese, de Allan Kardec. O texto que se segue contém a passagem bíblica da parte da gênese referente à Adão e Eva, e posteriormente a explicação espírita para o assunto.

Ora, o Senhor Deus plantara desde o começo um jardim delicioso, no qual colocou o homem que formara. – O senhor Deus também produzira da terra todas as espécies de árvores belas à visão e cujos frutos eram agradáveis ao gosto, e a árvore da vida no meio do paraíso, com a árvore da ciência do bem e do mal.

O Senhor tomou, pois, o homem e o colocou no paraíso de delícias, a fim de que o cultivasse e guardasse. Deu-lhe também esta ordem e lhe disse: Comei de todas as árvores do paraíso. Mas não comas do fruto da árvore da ciência do bem e do mal; porque no mesmo tempo que dela comeres morrerás muito certamente.

Ora, a serpente era o mais sagaz de todos os animais que o Senhor formara sobre a Terra. Ele disse à mulher: Por que Deus vos ordenou para não comer o fruto de todas as árvores do paraíso? É que disse, Eloim: não comereis  de nenhuma árvore do jardim? A mulher lhe respondeu: Nós comemos os frutos de todas as árvores que estão no paraíso. Mas para o que é o fruto da árvore que está no meio do paraíso, Deus nos ordenou para dela não comer, e não tocá-la, de medo que estivéssemos em perigo de morrer. A serpente respondeu à mulher: Seguramente, não morrereis; mas é que Deus sabe que logo que houverdes comido desse fruto, os vossos olhos serão abertos, e sereis como deuses, conhecendo o bem e o mal.

A mulher considerou, pois, que o fruto dessa árvore era bom para comer; que era belo e agradável à visão. E tendo-o tomado, comeu-o, e dele deu ao seu marido para que comesse também.

E como eles ouviram a voz do Senhor Deus, que passeava no paraíso depois do meio dia, quando se eleva um vento brando, eles se retiraram para o meio das árvores do paraíso, para se esconderem de diante de sua face.

Então o Senhor chamou Adão, e disse-lhe: Onde estais? Adão lhe respondeu: Eu ouvi a vossa voz no paraíso, e tive medo porque estava nu; foi por isso que me ocultei. O Senhor lhe respondeu: De onde soubestes que estáveis nu, senão porque comestes do fruto da árvore da qual vos proibi de comer? Adão lhe respondeu: A mulher que me destes por companheira me apresentou o fruto dessa árvore, e eu comi. O Senhor Deus disse à mulher: Por que fizestes isso? Ela respondeu: A serpente me enganou, e eu comi desse fruto.

Então o Senhor Deus disse à serpente: Porque fizeste isso, és maldita entre todos os animais e todas as bestas da Terra; rastejarás sobre o ventre, e comerás a terra todos os dias de tua vida. Colocarei uma inimizade entre ti e a mulher, entre a sua raça e a tua. Ela te quebrará a cabeça e tu tratarás de mordê-la pelo calcanhar.
Deus disse também à mulher: Eu vos afligirei com vários males durante a vossa gravidez; parireis na dor; estareis sob a dominação de vosso marido, e ele vos dominará.

Disse em seguida a Adão: Porque escutastes a voz de vossa mulher, e comestes do fruto da árvore da qual vos proibi de comer, a terra será maldita por causa do que fizestes, e dela não tirareis de que vos alimentar durante toda a vossa vida senão com muito trabalho.

Ela vos produzirá espinhos e sarças, e vos nutrireis da erva da terra. E comereis o vosso pão com o suor de vosso rosto, até que retorneis à terra de onde fostes tirado, porque sois pó, e em pó retornareis.

E Adão deu à sua mulher o nome de Eva, que significa a vida, porque era a mãe de todos os viventes.

O Senhor Deus fez também, para Adão e sua mulher, roupas de peles com as quais os revestiu. E disse: Eis Adão tornado como um dos nossos sabendo o bem e mal. Impeçamos, pois, agora, que não leve sua mão à árvore da vida, que não tome também de seu fruto, e que, comendo desse fruto, não viva eternamente.

O Senhor Deus fê-lo sair do jardim de delícias, a fim de que fosse trabalhar na cultura da terra de onde fora tirado.

E tendo-os expulsado, colocou os querubins diante do jardim de delícias, que  faziam cintilar uma espada de fogo, para guardar o caminho que conduzia à árvore da vida.


           Sob uma imagem pueril, e às vezes ridícula, detendo-se na forma, a alegoria esconde, frequentemente, as maiores verdades. (...) Na Gênese, é necessário ver as grandes verdades morais sob figuras materiais que, tomadas pela letra, seriam tão absurdas quanto se, em nossas fábulas, se tomassem pelas letras as cenas e os diálogos atribuídos aos animais.

          Adão é a personificação da Humanidade; sua falta individualiza a fraqueza do homem, em quem predominam os instintos  materiais, aos quais não sabe resistir. (Está bem reconhecido hoje que a palavra hebraica haadam não é um nome próprio, mas que significa o homem em geral, a Humanidade, o que destrói todo o alicerce construído sobre a personalidade de Adão.)

          A árvore, como árvore da vida, é o emblema da vida espiritual; como árvore da ciência, é o da consciência do homem que adquire do bem e do mal para o desenvolvimento de sua inteligência, e do livre-arbítrio em virtude do qual ele escolhe entre os dois; marca o ponto em que a alma do homem deixa de ser guiada somente pelos instintos, toma posse de sua liberdade e incorre na responsabilidade de seus atos.

          O fruto da árvore é o emblema do objetivo dos desejos materiais do homem; é a alegoria da cobiça e da concupiscência; resume, sob uma mesma figura, os motivos de arrastamento ao mal; comê-lo, é sucumbir à tentação. Ele cresce no meio do jardim das delícias para mostrar que a sedução está no próprio seio dos prazeres, e lembrar que, se o homem dá preponderância aos gozos materiais, prende-se à Terra e afasta-se de sua destinação espiritual.

          A morte da qual está ameaçado, se transgride a proibição que lhe é feita, é uma advertência das consequências inevitáveis, físicas e morais, que arrasta a violação das leis divinas, que Deus gravou em sua consciência. É bem evidente que não se trata aqui da morte corpórea, uma vez que, depois de sua falta, Adão vive ainda por muito tempo, mas bem da morte espiritual, dito de outro modo, da perda dos bens que resultam do adiantamento moral, perda da qual a sua expulsão do jardim das delicias é a imagem.

          A serpente está longe de passar hoje pelo tipo da astúcia; está, pois, aqui, com relação à sua forma antes que pelo seu caráter, uma alusão à perfídia dos maus conselhos que deslizam como a serpente, e nos quais, frequentemente, por essa razão, não se confia mais. Alias, se a serpente, por ter enganado a mulher, foi condenada a rastejar sobre o ventre, isso queria dizer que ela antes tinha pernas, e, então, não era mais uma serpente.

          É necessário, notar, por outro lado, que a palavra hebraica nâhâsch, traduzida pela palavra serpente, vem da raiz nâhâsch que significa: fazer encantamentos, adivinhar as coisas ocultas, e pode significar: encantador, adivinho. (...) Não foi senão na versão dos Setenta, - que segundo Hutcheson, corromperam o texto hebreu em muito lugares, - escrita em grego no segundo século antes da era cristã, que a palavra nâhâsch foi traduzida por serpente. As inexatidões dessa versão, sem dúvida, prendem-se às modificações que a língua hebraica sofrera no intervalo; porque o hebreu do tempo de Moisés era então uma língua morta, que diferia do hebreu vulgar, tanto quanto o grego antigo e o árabe literário diferem do grego e do árabe modernos.



          A passagem onde está dito que: “O Senhor passeava pelo paraíso, depois do meio-dia, quando se levantou um vendo brando.” (...) Nada tem que deva surpreender reportando-se à ideia que os Hebreus, dos tempos primitivos, faziam da divindade. Para essas inteligências rudes, incapazes de conceber abstrações, Deus devia revestir uma forma concreta, e referiam tudo à Humanidade como ao único ponto conhecido. (...) É necessário, pois, considerar essa passagem como uma alegoria da Divindade vigiando ela mesma os objetos de sua criação.

(...)

         Deus não  criara Adão e Eva para que permanecessem sozinhos sobre a Terra; e a prova disso está nas próprias palavras que dirigiu imediatamente depois de sua formação, então quando ainda estavam no paraíso terrestre: “Deus os abençoou e disse: Crescei e multiplicai-vos, enchei a Terra e sujeitai-a.” (Cap. I, v. 28.) Uma vez que a multiplicação do homem era uma lei desde o paraíso terrestre, a sua expulsão não poderia ter por causa o fato suposto.

         O que dá crédito a essa suposição é o sentimento de vergonha de que Adão e Eva foram tomados diante de Deus, e que os levou a se esconderem. Mas essa própria vergonha é uma figura por comparação: ela simboliza a confusão que todo culpado sente em presença daquele a quem ofendeu. (...) Hoje, sabemos que essa falta não foi um ato isolado, pessoal a um indivíduo, mas que ela compreender, sob um fato alegórico único, o conjunto das prevaricações das quais pode se tornar culpada a humanidade ainda imperfeita da Terra, e que se resumem nestas palavras: infração às leis de Deus. Eis por que a falta do primeiro homem, simboliza a humanidade, foi simbolizada, ela mesma, por um ato de desobediência.

         Dizendo a Adão que ele tiraria o seu alimento da terra como suor de seu rosto, Deus simboliza a obrigação do trabalho; mas por que faz do trabalho uma punição? Que seria da inteligência do homem se ela não se desenvolvesse pelo trabalho? Que seria a terra, se ela não fosse fecundada, transformada, saneada pelo trabalho inteligente do homem?

         Está dito (cap. II, v. 5 e 7): “O Senhor Deus não fizera ainda chover sobre a Terra, e não tinha nenhum homem para trabalhá-la. O Senhor formou, pois, o homem do limo da terra.” Estas palavras, aproximadas destas: Enchei a Terra, provam que o homem estava, desde a origem, destinado a ocupar toda a Terra e a cultivá-la; e, por outro lado, que o paraíso terrestre não era um lugar circunscrito sobre um canto do globo. Se a cultura da Terra deveria ser a consequência da falta de Adão, disso resulta que, se Adão não pecasse, a Terra ficaria inculta, e que os objetivos de Deus não teriam se cumprido.

         Por que disse Ele à mulher que, porque ele cometeu a falta, parirá na dor? Como a dor do parto pode ser um castigo, uma vez que é a consequência do organismo, e que está fisiologicamente provado que ela é necessária? Como uma coisa que está segundo as leis da natureza pode ser uma punição? (...)

         Notemos, em primeiro lugar que se, no momento da criação de Adão e Eva, sua alma fosse tirada do nada, como se ensina, elas deveriam ser noviças em todas as coisas; não deveriam saber o que é morrer. Uma vez que estavam sós sobre a Terra, enquanto viveram no paraíso terrestre, não viram ninguém morrer; como compreenderiam o que era morrer? Como Eva poderia compreender que parir na dor seria uma punição, uma vez que, acabaria de nascer para a vida, nunca tivera filhos, e que era a única mulher no mundo? (...) Não deveriam compreender nem o Criador nem o objetivo da proibição que lhes fazia.

         O Espiritismo explica sem dificuldade e de maneira racional, pela anterioridade da alma e a pluralidade das existências, lei sem a qual tudo é mistério e anomalia na vida do homem. Com efeito, admitamos que Adão e Eva já tenham vivido, tudo se encontra justificado: Deus não lhes fala como a crianças, mas como a seres em estado de compreender e que o compreendem, prova evidente de que tem um conhecimento anterior. Admiramos, por outro lado, que viveram num mundo mais avançado e menos material do que o nosso, onde o trabalho do espírito supria o trabalho do corpo; que pela sua rebelião à lei de Deus, figurada pela desobediência, hajam sido excluídos e exilados, por punição, sobre a Terra, onde o homem, em consequência da natureza do globo, está sujeito a um trabalho corporal, Deus tinha razão em dizer-lhes: No mundo onde ides viver doravante, “cultivareis a terra e dela retirareis o vosso alimento com o suor do vosso rosto;” e à mulher: “Parireis com dor,” porque tal é a condição deste mundo.

         O paraíso terrestre, cujos traços inutilmente se tem procurado sobre a Terra, era, pois, a figura onde vivera Adão, ou, antes, a raça dos espíritos dos quais é a personificação. A expulsão do paraíso marca o momento em que esses espíritos vieram se encarnar entre os habitantes deste mundo, e a mudança de situação que lhe foi a consequência. O anjo armado de uma espada flamejante, que proíbe a entrada no paraíso, simboliza a impossibilidade em que estão os espíritos dos mundos inferiores de penetrar nos mundos superiores, antes de tê-lo merecido por sua depuração.

         Eram necessários os conhecimentos trazidos pelo Espiritismo a respeito das relações do princípio espiritual e do princípio material, sobre a natureza da alma, sua criação no estado de simplicidade e de ignorância, sua união com o corpo, sua marcha progressiva indefinida através das existências sucessivas, e através dos mundos que são outros tantos degraus no caminho do aperfeiçoamento, sua libertação gradual da influência da matéria pelo uso de seu livre-arbítrio, a causa de seus pendores bons ou maus e de suas aptidões, o fenômeno do nascimento e da morte, o estado do espírito na erraticidade, enfim, o futuro que é o prêmio de seus esforços para se melhorar e de sua perseverança no bem, para lançar a luz sobre todas as partes da Gênese espiritual.

        Graças a esta luz, o homem sabe doravante de onde vem, para onde vai, por que está sobre a Terra e por que sobre; sabe que o seu futuro está entre as suas mãos, e que a duração de seu cativeiro neste mundo depende dele. A Gênese, saída da alegoria estreita e mesquinha,aparece-lhe grande e digna da majestade, da bondade e da justiça do Criador. Considerada deste ponto de vista, a Gênese confundirá a incredulidade e vencê-la-á.     


Fonte: A Gênese – Os Milagres e as Predições Segundo o Espiritismo. Allan Kardec. Cap. XII.



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