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quinta-feira, 5 de julho de 2018

ENCARNAÇÃO DOS ESPÍRITOS

          O Espiritismo nos ensina de que maneira se opera a união do espírito e do corpo na encarnação.

          O espírito, pela sua essência espiritual, é um ser indefinido, abstrato, que não pode ter uma ação direta sobre a matéria, sendo-lhe necessário um intermediário; esse intermediário está no envoltório fluídico que faz, de alguma sorte, parte integrante do espírito, envoltório semi-material, quer dizer, tendo da matéria por sua origem e da espiritualidade por sua natureza etérea; como toda matéria, ela é haurida no fluido cósmico universal, que sofre nessa circunstância, uma modificação especial. Esse envoltório, designado sob o nome de perispírito, de um ser abstrato, faz um ser concreto, definido, perceptível pelo pensamento; ele o torna apto para agir sobre a matéria tangível, do mesmo modo que todos os fluidos imponderáveis, que são, como se sabe, os mais poderosos motores.


        O fluido perispiritual é, pois, o traço de união entre o espírito e a matéria. Durante a sua união com o corpo, é o veículo de seu pensamento, para transmitir o movimento às diferentes partes do organismo que agem sob o impulso de sua vontade, e para repercutir no espírito as sensações produzidas pelos agentes exteriores. Ele tem por fio condutor os nervos.

        Quando o espírito deve se encarnar num corpo humano em vias de formação, um laço fluídico, que não é outra coisa senão uma expansão do seu perispírito, liga-o ao germe para o qual se acha atraído, por uma força irresistível, desde o momento da concepção. À medida que o germe se desenvolve, o laço se aperta; sob a influência do princípio vital material do germe, o perispírito, que possui certas propriedades da matéria, se une, molécula a molécula, com o corpo que se forma: de onde se pode dizer que o espírito, por intermédio de seu perispírito, toma, de alguma sorte, raiz nesse germe, como uma planta na terra. Quando o germe está inteiramente desenvolvido, a união é completa, e, então, ele nasce para a vida exterior.

         Por um efeito contrário, essa união do perispírito e da matéria carnal, que se cumprira sob a influência do princípio vital do germe, quando esse princípio deixa de agir, em consequência da desorganização do corpo, a união, que era mantida por uma força atuante, cessa quando essa força deixa de agir; então o perispírito se desliga, molécula a molécula, como estava unido, e o espírito se entrega à sua liberdade. Assim, não é a partida do espírito que causa a morte do corpo, mas a morte do corpo que causa a partida do espírito.

        Desde o instante que se segue à morte, a integridade do espírito está inteira; que as suas faculdades adquirem mesmo uma penetração maior, ao passo que o princípio de vida está extinto do corpo, é a prova evidente de que o princípio vital e o princípio espiritual são duas coisas distintas.

        O Espiritismo nos ensina, pelos fatos que nos faculta observar, os fenômenos que acompanham essa separação; algumas vezes, ela é rápida, fácil, doce e insensível; de outras vezes, é lenta, laboriosa, horrivelmente penosa, segundo o estado moral do espírito, e pode durar meses inteiros.

        Um fenômeno particular, igualmente assinalado pela observação, acompanha
sempre a encarnação do espírito. Desde que este é preso pelo laço fluídico que o liga ao germe, a perturbação se apodera dele; essa perturbação cresce à medida que o
laço se aperta, e, nos últimos momentos, o espírito perde toda a consciência de si mesmo, de sorte que ele nunca é testemunha consciente de seu nascimento. No momento em que a criança respira, o espírito começa a recobrar as suas faculdades, que se desenvolvem à medida que se formam e se consolidam os órgãos que devem servir para a sua manifestação.

         Mas, ao mesmo tempo que o espírito recobra a consciência de si mesmo, ele perde a lembrança de seu passado, sem perder as faculdades, as qualidades e as aptidões adquiridas anteriormente, aptidões que estavam, momentaneamente, estacionadas em seu estado latente e que, em retomando a sua atividade, vão ajudá-lo a fazer mais e melhor do que o fazia precedentemente; ele renasce o que se fez pelo seu trabalho anterior, é, para ele, um novo ponto de partida, um novo degrau a subir. Aqui ainda se manifesta a bondade do Criados,porque a lembrança de um passado, frequentemente penoso ou humilhante, juntando-se às amarguras de sua nova existência, poderia perturbá-lo ou entravá-lo; ele não se lembra senão daquilo que aprendeu, porque isso lhe é útil. Se, algumas vezes, conserva uma vaga intuição dos acontecimentos passados, é como a lembrança de um sonho fugido. É, pois, um homem novo, por ancião que seja o seu espírito, ele se apoia sobre novos hábitos, com a ajuda dos que adquiriu. Quando ele entra na vida espiritual, o seu passado se desenrola aos seus olhos, e julga se empregou bem ou mal o seu tempo.

         Não há, pois, solução de continuidade na vida espiritual, apesar do esquecimento do passado; o espírito é sempre ele, antes, durante a encarnação e depois dela; a encarnação não é senão uma fase especial de sua existência. Esse esquecimento não ocorre mesmo senão durante a vida exterior de relação; durante o sono, o espírito, em parte desligado dos laços carnais, entregue à liberdade e à vida espiritual, lembra-se; sua visão espiritual não é mais tanto obscurecida pela matéria.

(...)

         A obrigação, para o espírito encarnado, de prover à nutrição de seu corpo, sua segurança e seu bem estar, constrange-o a aplicar as suas faculdades na busca de exercê-las e desenvolvê-las. Sua união com a matéria é, pois, útil ao seu adiantamento; eis por que a encarnação é uma necessidade. Por outro lado, pelo trabalho inteligente que realiza em seu proveito sobre a matéria, concorre para a transformação e o progresso material do globo em que habita; assim é que, progredindo ele mesmo, colabora na obra do Criador, de que é agente inconsciente.

         Mas a encarnação do espírito não é constante nem perpétua; não é senão transitória; deixando um corpo, não retoma outro imediatamente; durante um lapso de tempo mais ou menos considerável, vive da vida espiritual, que é a vida normal; de tal sorte que a soma do tempo passado nas diferentes encarnações é pouca coisa, comparada ao tempo que ele passa no estado de espírito livre.

         No intervalo dessas encarnações, o espírito progride igualmente, no sentido de que aproveita, para o seu adiantamento, os conhecimentos e a experiência adquiridos na vida corpórea; ele examina o que fez em sua permanência terrestre, passa em revista o que aprendeu, reconhece suas faltas, organiza seus planos e toma as resoluções segundo as quais conta guiar-se numa nova existência, tratando de fazer o melhor. Assim é que cada existência é um passo adiante na via do progresso, uma espécie de escola de aplicação.

         A encarnação não é, pois, normalmente, uma punição para o espírito, como alguns o pensam, mas uma condição inerente à inferioridade do espírito e um meio de progredir.

         À medida que o espírito progride moralmente, ele se desmaterializa, quer dizer que, subtraindo-se à influência da matéria, depura-se; sua vida se espiritualiza, suas faculdades e suas percepções se estendem; sua felicidade está em razão do progresso realizado. Mas como age em virtude do seu livre-arbítrio, pode, por negligência ou má vontade, retardar o seu adiantamento; prolongar, por conseguinte, a duração de suas encarnações materiais, que se tornam então,para ele, uma punição, uma vez que, por sua falta, permaneceu nas classes inferiores, obrigado a recomeçar a mesma tarefa. Depende, pois, do espírito abreviar, por seu trabalho e depuração de si mesmo, a duração do período de encarnação. 

          O progresso material de um globo segue o progresso moral de seus habitantes; ora, como a criação dos mundos e dos espíritos é incessante, que estes progridem mais ou menos rapidamente, em virtude de seu livre-arbítrio, disso resulta que há mundos mais ou menos antigos, em diferentes graus de adiantamento físico e moral, onde a encarnação é mais ou menos material, e onde, por conseguinte, o trabalho, para os espíritos, é mais ou menos rude. Sob esse ponto de vista, a Terra é um dos menos avançados; povoada de espíritos relativamente inferiores, a vida corpórea nela é mais penosa do que em outros, como ocorre com os mais atrasados, onde é ainda mais penosa que sobre a Terra, e para os quais a Terra seria, relativamente, um mundo feliz. 

                 

          Quando os espíritos adquiriram, sobre um mundo, a soma do progresso que o estado desse mundo comporta, deixam-no para se encarnarem num outro mais avançado, onde adquirem novos conhecimentos, e assim por diante até que, não lhes sendo mais útil a encarnação num corpo material, vivem exclusivamente da vida espiritual, onde progridem ainda num outro sentido e por outros meios. Chegados ao ponto culminante do progresso, gozam da suprema felicidade; admitidos nos conselhos do Todo-Poderoso, tem seu pensamento, tornam-se seus mensageiros, seus ministros diretos para o governo dos mundos, tendo sob suas ordens os espíritos em diferentes graus de adiantamento.

         Assim, todos os espíritos, encarnados e desencarnados, em qualquer grau de hierarquia a que pertençam, desde o menor ao maior, tem as suas atribuições no grade mecanismo do Universo; todos são uteis ao conjunto, ao mesmo tempo que são úteis a si mesmos; aos menos avançados, como a de simples operários, incumbe uma tarefa material, de início inconsciente, depois gradativamente inteligente. Por toda parte há atividade no mundo espiritual, em nenhuma parte a ociosidade inútil.

          A coletividade dos espíritos, de alguma sorte, é a alma do Universo; é o elemento espiritual que age em tudo e por toda parte, sob o impulso do pensamento divino. Sem esse elemento, não há senão a matéria inerte, sem objetivo, sem inteligência, sem outro motor que as forças materiais que deixam uma multidão de problemas insolúveis; pela ação do pensamento espiritual individualizado, tudo tem um objetivo, uma razão de ser, tudo se explica; eis por que, sem a espiritualidade, tropeça-se com dificuldades insuperáveis.


Fonte: A Gênese – Os Milagres e as Predições Segundo o Espiritismo. Allan Kardec. Cap. XI.


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