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terça-feira, 14 de maio de 2019

O CONTROLE UNIVERSAL DO ENSINAMENTO DOS ESPÍRITOS

O texto abaixo está contido no livro O Evangelho Segundo o Espiritismo, de Allan Karde, na introdução da obra, item II. Em que Kardec explica como se deu o recebimento da Doutrina e como se deu o controle dos ensinamentos passados pelos Espíritos Superiores. 
Há várias edições de editoras diversas dos livros acima,
em que as capas mudam, mas o conteúdo é o mesmo. 


        Se a Doutrina Espírita fosse uma concepção puramente humana, ela não teria por garantia senão as luzes daquele que a tivesse concebido; ora, ninguém neste mundo teria a pretensão fundada de possuir só para si a verdade absoluta. Se os Espíritos que a revelaram tivessem se manifestado a um único homem, nada lhe garantiria a origem, porque seria preciso crer sobre a palavra em quem dissesse ter recebido seus ensinamentos. Admitindo uma perfeita sinceridade da sua parte, quando muito, poderia convencer as pessoas do seu meio; poderia ter seus seguidores, mas não chegaria jamais a reunir a todos. 

       Deus quis que a nova revelação chegasse aos homens por uma via mais rápida e mais autentica; por isso encarregou os Espíritos de irem levá-la de um polo a outro, manifestando-se por toda parte, sem dar a ninguém o privilégio exclusivo de ouvir sua palavra. Um homem pode ser enganado, pode enganar a si mesmo, mas isso não ocorreria quando milhões veem e ouvem a mesma coisa: é uma garantia para cada um e para todos. Aliás, pode-se fazer desaparecer um homem, mas não se pode fazer desaparecerem as massas; podem-se queimar os livros, mas não se podem queimar os Espíritos; ora, queimem-se os livros, e a fonte da doutrina não seria, por isso, menos inesgotável, pelo fato mesmo de que ela não está na Terra, as surge de toda parte e cada um a pode haurir. Na falta dos homens para propagá-la, haverá sempre os Espíritos, que alcançam todo o mundo e que ninguém pode atingir.

        São, pois, os próprios Espíritos, em realidade, que fazem a propaganda, com a ajuda dos inumeráveis médiuns que eles suscitam de todos os lados. Se não tivesse havido um interprete único, por mais favorecido que fosse, o Espiritismo seria mal conhecido; o próprio intérprete, a qualquer classe que pertencesse, teria sido objeto de prevenções da parte de muitas pessoas; todas as nações não o teriam aceitado, ao passo que os Espíritos se comunicando por toda a parte, a todos os povos, a todas as seitas e a todos os partidos, são aceitos por todos. O Espiritismo não tem nacionalidade, está fora de todos os cultos particulares e não foi imposto por nenhuma classe social, uma vez que cada um pode receber instruções de seus parentes e de seus amigos de além-túmulo. Era preciso que fosse assim para que se pudessem chamar todos os homens à fraternidade; se não tivesse se colocado sobre um terreno neutro, ele teria mantido as dissensões ao invés de apaziguá-las.

        Esta universalidade no ensinamento dos Espíritos faz a força do Espiritismo, e é também a causa da sua propagação tão rápida; ao passo que a voz de um único homem, mesmo com o socorro da imprensa, empregaria séculos antes de chegar ao ouvido de todos, eis que milhares de vozes se fazem ouvir simultaneamente sobre todos os pontos da Terra, para proclamar os mesmos princípios, e transmiti-los aos mais ignorantes e aos mais sábios, a fim de que ninguém seja deserdado. É uma vantagem da qual não gozou nenhuma das doutrinas que surgiram até hoje. Se, pois, o Espiritismo é uma verdade, ele não teme nem a má vontade dos homens, nem as revoluções morais, nem as comoções físicas do globo, porque nenhuma dessas coisas pode atingir os Espíritos.

(...)

        Sabe-se que os Espíritos, em consequência da diferença que existe e suas capacidades, estão longe de, individualmente, estarem na posse de toda a verdade; que não é dado a todos penetrar certos mistérios; que seu saber é proporcional à sua depuração; que os Espíritos vulgares não sabem mais que os homens, e menos que certos homens; que há entre eles, como entre estes últimos, presunçosos e pseudo-sábios que creem saber o que não sabem e sistemáticos que tomam suas ideias pela verdade; enfim, que os Espíritos de ordem mais elevada, aqueles que estão completamente desmaterializados, são os únicos despojados das ideias e preconceitos terrestres; mas sabe-se também que os Espíritos enganadores não tem escrúpulos em se abrigarem sob nomes que tomam emprestados, para fazerem aceitar suas utopias. Disso resulta que, para tudo o que está fora do ensinamento exclusivamente moral, as revelações que cada um pode obter tem um caráter individual, sem autenticidade; que elas devem ser consideradas como opiniões pessoais de tal ou tal Espírito, e que haveria imprudência em aceitá-las e promulgá-las levianamente como verdades absolutas.

        O primeiro controle é, sem contradita, o da razão, ao qual é preciso submeter, sem exceção, tudo o que vem dos Espíritos; toda teoria em contradição manifesta com o bom senso, como uma lógica rigorosa e com os dados positivos que se possui, com qualquer nome respeitável que esteja assinada, deve ser rejeitada. Mas esse controle é incompleto em muitos casos, em consequência da insuficiência de luzes de certas pessoas, e da tendência de muitos em tomar seu próprio julgamento por único árbitro da verdade. Em semelhante caso, que fazem os homens que não tem em si mesmos uma confiança absoluta? Eles tomam o conselho de maior número, e a opinião da maioria é seu guia. Assim deve ser com respeito ao ensinamento dos Espíritos, que nos fornecem, eles mesmos, os meios de controle.

         A concordância no ensinamento dos Espíritos é, pois, o melhor controle; mas é preciso, ainda, que ela ocorra em certas condições. A menos segura de todas é quando o próprio médium interroga vários Espíritos sobre um ponto duvidoso; é bem evidente que, se está sob o império de uma obsessão ou se relaciona com um Espírito enganador, esse Espírito pode lhe dizer a mesma coisa sob nomes diferentes. Não há uma garantia suficiente na conformidade que se pode obter pelos médiuns de um único centro, porque eles podem sofrer a mesma influência.

         A garantia única, séria, do ensinamento dos espíritos está na concordância que existe entre as revelações feitas espontaneamente, por intermédio de um grande número de médiuns, estranhos uns aos outros, e em diversos lugares.

        Concebe-se que não se trata aqui de comunicações relativas a interesses secundários, mas das que se prendem aos próprios princípios da doutrina. A experiência prova que, quando um princípio novo deve receber sua solução, ele é ensinado espontaneamente sobre diferentes pontos ao mesmo tempo, e de maneira idêntica, se não quanto à forma, pelo menos quanto ao fundo. Se, pois, apraz a um Espírito formular um sistema excêntrico, baseado sobre suas próprias ideias, e fora da verdade, pode-se estar certo que esse sistema ficará circunscrito,e cairá diante da unanimidade das instruções dadas por toda parte, alhures, como já se tem disso vários exemplos. Foi esta unanimidade que fez cair todos os sistemas parciais que despontaram na origem do Espiritismo, quando cada um explicava os fenômenos à sua maneira, e antes que se conhecessem as leis que regem as relações do mundo visível e do mundo invisível.

        Tal é a base a qual nos apoiamos quando formulamos um princípio da doutrina; não é porque está de acordo com as nossas ideias que o damos como verdadeiro; não nos colocamos, de modo algum, como árbitro supremo da verdade, e não dizemos a ninguém: “Crede em tal coisa, porque nós vo-la dizemos”. Nossa opinião não é, aos nossos próprios olhos, senão uma opinião pessoal que pode ser justa ou falsa, porque não somos mais infalíveis que um outro. Não é porque um princípio nos é ensinado que ele é para nós a verdade, mas porque recebeu a sanção da concordância.

        Na nossa posição, recebemos as comunicações de perto de mil centros espíritas sérios,disseminados sobre os diversos pontos do globo, estamos em condições de ver os princípios sobre os quais essa concordância se estabelece; é esta observação que nos tem guiado até hoje, e é, igualmente, a que nos guiará nos novos campos a que o Espiritismo está chamado a explorar. É assim que, estudando atentamente as comunicações chegadas de diversas partes, tanto da França como do exterior, reconhecemos, na natureza toda especial das revelações, que há tendência para entrar em um novo caminho, e que é chegado o momento de dar um passo à frente. Essas revelações, por vezes feitas com palavras veladas, frequentemente, passaram desapercebidas para muitos daqueles que as obtiveram; muitos outros acreditam tê-las com exclusividade. Tomadas isoladamente, para nós seria sem valor; só a coincidência lhes dá gravidade; depois, quando é chegado o momento de liberá-las à luz da publicidade, cada um, então se lembra de ter recebido instruções no mesmo sentido. É este o movimento geral que observamos, que estudamos, com a assistência dos nossos guias espirituais, e que nos ajuda a julgar da oportunidade para fazermos uma coisa ou dela nos abstermos.

       Este controle universal é uma garantia para a unidade futura do Espiritismo, e anulará todas as teorias contraditórias. É nele que, no futuro, se procurará o critério da verdade. O que fez o sucesso da doutrina formulada em O Livro dos Espíritos e em O Livro dos Médiuns, foi que, por toda parte, cada um pode receber diretamente dos Espíritos a confirmação do que eles contêm. Se, de todas as partes, os Espíritos tivessem vindo contradizê-los, esses livros teriam, depois de tanto tempo, suportado a sorte de todas as concepções fantásticas. O próprio apoio da imprensa não os teria salvo do naufrágio, ao passo que, privados desse apoio, não tiveram um caminho menos rápido, porque tiveram o apoio dos Espíritos, cuja boa vontade compensou, em muito, a má vontade dos homens. Assim o será com todas as ideias emanadas dos Espíritos ou de homens que não puderam suportar a prova deste controle, do qual ninguém pode contestar o poder.

(...)

        O princípio da concordância é, ainda, uma garantia contra as alterações que poderiam infligir ao Espiritismo as seitas que gostariam de se apoderar dele em seu proveito, e acomodá-lo à sua maneira. Quem tentasse desviá-lo do seu objetivo providencial, fracassaria, pela simples razão de que os Espíritos, pela universalidade de seu ensinamento, farão cair toda modificação que se afaste da verdade.

        Resulta de tudo isso uma verdade capital: é que quem quisesse se colocar contra a corrente de ideias, estabelecidas e sancionadas, poderia causar uma pequena perturbação local e momentânea, mas jamais dominar o conjunto, mesmo no presente, e ainda menos no futuro.

        Disso resulta mais: que as instruções dadas pelos Espíritos sobre os pontos da doutrina ainda não elucidados, não seriam lei, porquanto ficariam isoladas; que elas não devem, por conseguinte, ser aceitas senão com todas as reservas e a título de informação.

        Daí a necessidade de se ter, na sua publicação, a maior prudência, e, no caso em que se acreditasse dever publicá-las, importaria não as apresentar senão coo opiniões individuais, mais ou menos prováveis, mas tendo, em todos os casos, necessidade de confirmação. É esta confirmação que se precisa alcançar antes de se apresentar um princípio como verdade absoluta, se não se quer ser acusado de leviandade ou de credulidade irrefletida.

        Os Espíritos superiores procedem, nas suas revelações, com uma extrema sabedoria; eles não abordam as grandes questões da doutrina senão gradualmente, à medida que a inteligência está apta a compreender verdades de uma ordem mais elevada, e que as circunstâncias são propícias para a emissão de uma ideia nova. É por isso que, desde o princípio, eles não disseram tudo, e não disseram tudo ainda hoje, não cedendo jamais à impaciência de pessoas apressadas que querem colher os frutos antes de amadurecidos. Seria, pois, supérfluo querer antecipar o tempo assinalado para cada coisa pela Providência, porque então, os Espíritos verdadeiramente sérios recusariam positivamente seu concurso; mas os Espíritos levianos, pouco se incomodando com a verdade, respondem a tudo; é por essa razão que, sobre todas as questões prematuras, há sempre respostas contraditórias.

        Os princípios acima não são o resultado de uma teoria pessoal, mas a consequência inevitável das condições nas quais os espíritos se manifestam. É evidente que, se um espírito diz uma coisa de um lado, enquanto que milhões de espíritos dizem o contrario alhures, a presunção da verdade não pode estar com aquele que está só, ou quase só na sua opinião ora, pretender ter razão sozinho contra todos, seria tão ilógico da parte de um espírito, como da parte dos homens. Os espíritos verdadeiramente sábios, se não se sentem suficientemente esclarecidos sobre uma questão, não a decidem jamais de um modo absoluto; eles declaram não tratá-la senão sob seu ponto de vista, e aconselham esperar sua confirmação.

        Por grande, bela e justa que seja uma ideia, é impossível que ela reúna, desde o princípio, todas as opiniões. Os conflitos que dela resultam são a consequência inevitável do movimento que se opera; são mesmo necessários para melhor fazer ressaltar a verdade, e é útil que eles ocorram no princípio para que as ideias falsas sejam mais prontamente desgastadas. Os espíritas que nisso concebessem alguns temores devem estar, pois, tranquilizados. Todas as pretensões isoladas cairão, pela força das coisas, diante do grande e poderoso critério do controle universal.

        Não é à opinião de um homem que se deverá aliar-se, mas à voz unânime dos espíritos; não é um homem, não mais nós que um outro, que fundará a ortodoxia espírita; não é, tampouco, um espírito vindo se impor a quem quer que seja; é a universalidade dos espíritos se comunicando sobre toda a Terra por ordem de Deus; aí está o caráter essencial da doutrina espírita, sua força e sua autoridade. Deus quis que sua lei fosse assentada sobre uma base inabalável, por isso não a fez repousar sobre a cabeça frágil de um único homem.

(...)


Fonte: O Evangelho Segundo o Espiritismo. Allan Kardec. Introdução – item II.


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