E então vieram dias nos quais mais que nunca, havia uma aura de expectação em toda a Natureza e um mudo e singular anseio no coração dos homens.
As vozes dos profetas tinham soado, advertindo todo o mundo sobre o advento miraculoso e até mesmo o local do divino nascimento já estava determinado (...)
Estava-se no século de Augusto, sob um pleno reinado de paz e de glória.
O espírito dos dominadores saciado de vitórias e derrotas, repousava...
(...)
Rumores estranhos circulavam de boca em boca, de cidade em cidade, nação em nação, penetrando em todos os lares e corações; uma intuição maravilhosa e profunda de alguma coisa extraordinária que estava para acontecer, que modificaria a vida do mundo.
Olhos interrogadores se voltavam de contínuo para os céus, perscrutando os horizontes em busca de sinais e evidências desse acontecimento surpreendente que se aproximava.
As sibilas, oráculos e adivinhos eram consultados com mais frequência e os homens idosos, de mais experiência e bom conselho, eram procurados e ouvidos com mais respeito e reverência.
Foi quando Virgílio escreveu esta profecia memorável, que tão depressa viria a ter cumprimento:
- "Vede como todo o mundo se abala, como as terras e os vastos mares exultam de alegria, com o século que vai começar!... O Infante governará o mundo purificado... a serpente perecerá."
E, logo em seguida, como inspiradamente revelando a verdade:
- "Chegam, enfim, os tempos preditos pela sibila de Cumes: vai se abrir uma nova série de ciclos; a Virgem já volve ao reino de Saturno; surgirá uma nova raça; um novo rebento desce do alto dos céus."
E o grande dia, então, surgiu, quando o César desejando conhecer a soma de seus inumeráveis súditos, determinou o censo da população de todo o seu vasto império.
Então, José, carpinteiro modesto e quase desconhecido, da pequena vila de Nazaré, na Galileia dos Gentios e natural de Belém, tomou de sua esposa Míriam - que estava grávida - e empreendeu a jornada inesquecível. Por serem pobres e humildes, aceitaram o auxílio de amigos solícitos e abrigaram-se em um estábulo de granja. Ali, então, o grande fato da história espiritual do mundo sucedeu.
Aquele que devia redimir a humanidade de seus males foi ali exposto, envolto apressadamente em panos pobres e seus primeiros vagidos foram emitidos em pleno desconforto, salvo o que lhe vinha da desvelada assistência dos seus genitores; o mesmo desconforto, aliás, que O acompanharia em todos os dias de sua vida, que O levou a dizer mais tarde, já em pleno exercício de sua missão salvadora: "O Filho do Homem não tem onde repousar a cabeça."
O Espírito Glorioso e Divino deu assim ao mundo, desde o nascer, um exemplo edificante de humildade e de desprendimento; o desejado de todos os povos, o reclamado por todos os corações e anunciado por todos os profetas, em todas as línguas do mundo, então conhecido, nasceu, assim, quase ignorado numa casa humilde para que o Evangelho que ia mais tarde pregar, de renúncia e de fraternidade, recebesse d'Ele mesmo, desde os primeiros instantes, tão patético e comovente testemunho.
***
Emocionante momento esse!...
A estrela dos sacerdotes caldaicos se levantara no horizonte; o Verbo se fizera carne e, descendo à terra, habitara entre os homens.
O Sol, em seu giro fecundante, gloriosamente entrava em Peixes, e a ampulheta do tempo, nesse instante, marcou o encerramento de um ciclo que teve início, como já vimos, com a depuração espiritual do mundo, após a comunhão de espíritos do céu e da terra, a queda de uns servindo à elevação de outros, visando à unidade, que é a consumação fundamental da criação divina.
Também marcou a abertura de um outro ciclo, em que os frutos dos ensinamentos trazidos pelos Enviados do Senhor e por Ele próprio ratificados e ampliados, quando entre os homens viveu, brotassem, fecundos e promissores, da árvore eterna da vida, para que a evolução da humanidade, daí por diante, se desenvolvesse em bases morais mais sólidas e perfeitas.
(...) Ele desceu, o Divino Senhor, ao seio ignaro e impuro da massa humana terrestre, para trazer o auxílio prometido, para redimir com sua presença, sua exemplificação e seus ensinamentos sublimes, as duas raças de homens, a da Capela e a da Terra que, no correr dos tempos, mesclaram, confraternizaram e partilharam os mesmos sofrimentos, angústias e esperanças.
Fonte: Livro: Os Exilados da Capela. Edgard Armond. Capitulo XXI – E o Verbo se Fez Carne.